Escrevo com uma solenidade que me é estranha, como se fosse necessário
grande esforço para traduzir meus sentimentos nessas mal traçadas linhas. Logo
eu que sempre tive tanta intimidade com as palavras, logo eu que era preenchida
de uma alegria urgente quando escrevia, uma necessidade corrosiva. Nada restou
dessa ansiedade nostálgica e inflamante. Uma chama se erguia em mim quando
empunhava lápis ou passava a ponta dos dedos no teclado: as palavras eram
minhas amigas, aliadas. E agora que restou de tal cumplicidade? Alguns textos
velhos dos quais estou enjoada e uma técnica que só me é útil nas redações
escolares. Nada restou dos sentimentos maravilhosos que tomavam conta de mim ao
escrever.
Quase nada restou da menina que amava as palavras, que vivia em seu
mundo encantado e amava tudo quanto podia chamar de fantasia. Nada restou
daquela que sentia fervorosamente todo tipo de emoções, sem medo de se
machucar, pronta para ajudar todos que precisassem, movida por ideais fortes e
pronta para defendê-los a todo e qualquer custo.
Quê restou de mim? Quê restou de minha essência?
Vivo procurando uma faísca que seja, algo que me restaure a fé. A fé
em tudo. Fé que antes dominava cada parte de meu ser, e que hoje se esconde em
algum beco escuro e distante. Onde está minha fé? A parte de mim que mais me
era relevante, que me descrevia e me distinguia: cadê? A fé irradia o brilho e
a cor da alma de quem a tem, é fonte construtiva e restauradora. Se não move
barreiras e montanhas, ao menos ajuda a superá-las e a escalá-las.
Tudo está ligado ao pensamento, que é a maior força que temos. As
energias se moldam e se constroem sem que se perceba. E qual tem sido meu
pensamento? Um buraco negro como que suga minha mente: sempre para baixo,
dominada por pensamentos ruins que aos poucos vão levando minha vida para este
mesmo rumo.
Será que ao menos ando realmente pensando
ultimamente? Parece-me que ajo em um impulso nervoso, que vem de repente, onde
faço coisas nem ao menos cogitadas, sem uma faísca sequer se consciência,
ficando sã apenas após longo devaneio. Não penso, pois. Logo, existo? Se
existo, não sei, sei apenas que não vivo intensamente. E o senso crítico do qual tanto me orgulhava?
Foi-se antes que eu pudesse me dar conta.
O altruísmo também se foi, tal qual a vontade de ajudar e o amor que
tinha por quase todos: o amor que tinha pela vida.
Quê restou de mim, então? Não sou mais eu. Pois bem, quem sou? Não sou
nada mais do que já fui, perdi tudo que me era importante, menos as pessoas, e
até elas vejo distantes. Se não sou mais eu, quem sou agora? Um alguém perdido,
que tem medo de sentir, medo do indominável – que antes acrescentava chama
construtiva e desafiadora em minha vida, e que agora também temo. O maior temor
hoje, entretanto, se instaura na vida. E tenho tanto medo de viver
intensamente, de sentir verdadeiramente, que me escondo na penumbra entre a
vida e a morte, esperando que os dias se passem, um a um, lentamente...
Quê sobrou de mim? Sobrou o medo, que continua a corroer-me e a
destruir-me.
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