Com os pés descalços,
Agatha ia adentrando nos mistérios da floresta, passo a passo, sentindo a grama
úmida de orvalho e a terra entre seus dedos. As folhagens das árvores lhe
ocultavam o luar e dele ela podia apenas fisgar resquícios. Não enxergava nada senão
um breu de tons confusos, mas não tinha que enxergar muito: mesmo em sua
semi-cegueira, sabia exatamente para onde se dirigia. O cenário ficava cada vez
mais claro e lúcido e, vagarosamente, iam-se diminuindo os obstáculos pelo
caminho. Dois troncos a sua frente faziam um portal, retorcidos, unidos, no
gracioso esplendor da arquitetura da natureza. Agatha sorriu; seguiu a diante;
viu o luar. Era inóspito, distante. Brilhava em sua magia, solidão e mistério,
ainda assim fazendo parte de todo o cenário e cedendo-lhe um pouco de sua
magnificência e exuberância.
Estava em uma
clareira cercada de árvores gigantes e iluminada pelo tão altivo luar. O lobo a
esperava no centro da clareira: era enorme e belo, tinha olhos mansos, fortes e
destemidos – como deveria ter todo rei – e os pelos macios e aconchegantes. Uivou
com a chegada da bruxa, levantando-se nas patas trazeiras e tentando alcançar a
lua. Agatha correu a seu encontro e abraçou aquele que era seu protetor.
Deitaram-se ambos, aconchegando-se um a energia do outro, revigorando suas
almas em benefício daquela harmoniosa troca. Agatha acomodou-se sobre o
gigantesco lobo e observou a luz fantasmagórica da lua. Entraram em transe
juntos, bruxa e lobo, vendo o fim de toda uma Era do mundo que ficava do outro
lado do portal.
O que para os outros
era caos e destruição, para eles era bênção e redenção. Se os humanos viam um
fogaréu chamejante, os seres que tinham em si a Magia e a Verdade viam a luz explosiva
das salamandras a desejar glória à humanidade pela ascensão. Se os humanos viam
destrutivas rajadas de água, eles viam a pureza sendo enviada pelas ondinas em
forma de ondas revigorantes. E, se os furacões levavam as casas, eram os silfos
dizendo que não precisariam mais de tudo aquilo de tão material e concreto. Se
a terra engolia os carros, eram os gnomos dizendo que a mente viaja mais rápido
e não agride a mãe natureza.
O lobo uivou em
êxtase e, se a humanidade o visse, diria que seus olhos tingiam-se do vermelho
do sangue, que sua expressão era raivosa, que ele amava o caos. Mas ele amava a
vida e seu ciclo incessante de amor e renovação, ele amava a natureza e todas as
maravilhas que a acompanhavam, ele amava a magia e conseguia senti-la nas
menores coisas. Seus olhos tingiam-se de azul, como o céu puro e calmo. Sua
expressão era benevolente. Com o uivo do companheiro mágico, a bruxa despertou.
Na Terra, sua morada temporária, era vista como má. As pessoas eram ignorantes
e julgavam suas crenças e seu poder. Mas, em sua essência, ela estava em paz.
Em seu mundo, ela era compreendida e amada. Em seu mundo, toda a sua magia era
sagrada.
Ajoelhou-se e agradeceu à Lua.
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